*Fábio Correa Xavier

Em uma parceria entre o IRB – Instituto Rui Barbosa, por meio do Comitê de TI, Governança e Segurança da Informação, e da Atricon – Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil, foi feita uma pesquisa durante o mês de julho de 2024 sobre a adoção de soluções de Inteligência Artificial (IA) nos Tribunais de Contas (TCs) do Brasil. A pesquisa teve como objetivo principal avaliar o progresso e os desafios enfrentados na implementação dessa tecnologia em comparação com o ano anterior. O estudo envolveu a aplicação de um questionário abrangente, composto por 23 perguntas, a 33 Tribunais de Contas. Esses dados foram comparados com os resultados de uma pesquisa similar realizada em 2023, que utilizou um questionário mais limitado, com 10 perguntas. A análise resultante oferece uma visão detalhada do estado atual da IA nas Cortes de Contas brasileiras, identificando tanto os avanços quanto as barreiras ainda presentes na adoção dessa tecnologia.

Os dados quantitativos revelaram uma tendência clara de crescimento na aplicação de IA em áreas administrativas e de controle externo. Em 2024, mais de 60% dos tribunais já haviam implementado soluções de IA em suas áreas de controle externo, enquanto 20% relataram implementação em áreas administrativas. Esses números destacam a crescente integração da IA em funções críticas dos TCs, sugerindo um movimento em direção a uma maior eficiência e automação de processos.

Os dados mostraram uma redução na aplicação de IA na área de TI, de 36% em 2023 para 23% em 2024. Esse declínio pode ser interpretado como um sinal de que os TCs atingiram um ponto de maturidade na utilização da IA em TI, com os esforços sendo redirecionados para outras áreas, como a administrativa. Outra observação importante foi a redução na aplicação de IA em áreas diversas ou não especificadas, que caiu de 48% para 24%, sugerindo que os TCs estão se tornando mais estratégicos na aplicação de IA, com menos incertezas sobre onde e como utilizá-la.

A pesquisa evidenciou a crescente importância dada à especialização interna em IA. O aumento de 33% para 73% na especialização interna reflete um compromisso claro dos TCs em desenvolver capacidades próprias para a implementação e gestão de soluções de IA. Muitos tribunais expressaram preocupações sobre a falta de conhecimento técnico e a dificuldade em contratar serviços de IA com escopo fechado, apontando para uma lacuna significativa na capacitação interna. Essa limitação foi citada como um obstáculo para a implementação eficaz de soluções de IA, indicando a necessidade de maior investimento em treinamento e desenvolvimento de habilidades.

Outro ponto relevante foi a crescente preocupação com a segurança da informação e a privacidade dos dados, expressa por 87% dos entrevistados. Essa preocupação reflete uma tendência de aumento da conscientização sobre os riscos associados à implementação de IA, especialmente em áreas sensíveis, onde a proteção de dados e a segurança são cruciais.

A análise combinada dos dados quantitativos e qualitativos sugere que, embora haja uma adoção crescente da IA nos TCs, existem barreiras significativas que precisam ser superadas para maximizar o potencial dessa tecnologia. Um dos principais insights é a correlação positiva entre a especialização interna e a criação de estruturas organizacionais específicas para IA, com o número de TCs que implementaram tais estruturas aumentando de 12% para 24,2%. Isso indica que os TCs estão não apenas adotando a tecnologia, mas também criando as condições necessárias para que ela seja utilizada de maneira eficaz e sustentável.

Por outro lado, a dificuldade crescente na contratação de serviços de IA, com um aumento de 27% para 61%, comprova a necessidade de simplificar os processos de contratação e buscar parcerias que possam facilitar a adoção da tecnologia. Além disso, a propriedade interna dos códigos-fonte e a tendência de consumo interno das soluções indicam um controle forte sobre os projetos de IA, mas também sugerem uma possível falta de integração e colaboração interinstitucional.

A pesquisa identificou várias áreas que precisam de melhoria, sendo a capacitação técnica a principal delas. Com a falta de conhecimento técnico sendo uma das maiores barreiras relatadas, é crucial que os TCs invistam em programas robustos de treinamento para seus colaboradores. A resistência institucional à mudança também foi identificada como uma barreira crescente, aumentando de 18% para 30%, o que indica a necessidade de estratégias de gestão de mudanças mais eficazes.

A falta de uma estrutura organizacional específica para IA foi outro ponto de melhoria destacado. Sem uma estrutura adequada, os esforços de IA podem ser fragmentados e menos eficazes. Portanto, é desejável que os TCs analisem a possibilidade de criação de tais estruturas, alinhadas com suas estratégias de longo prazo.

Para melhorar a eficácia e a aplicação da IA nos TCs, algumas ações futuras puderam ser identificadas. Primeiramente, os TCs devem intensificar seus esforços em programas de capacitação, tanto para os servidores quanto para os gestores, garantindo que todos tenham as habilidades necessárias para trabalhar com IA. Em segundo lugar, é crucial que os TCs busquem soluções para simplificar e viabilizar os processos de contratação de serviços de IA, podendo ser por meio de parcerias com os grandes players do mercado.

Além disso, deve-se continuar investindo em segurança da informação e na formulação de políticas de privacidade robustas para proteger os dados e garantir a integridade dos sistemas de IA. A criação de estruturas organizacionais dedicadas à IA, que possam fornecer a governança e a orientação necessárias para o desenvolvimento e implementação bem-sucedidos dessas tecnologias, também é essencial. Por fim, os TCs devem considerar formas de compartilhar suas soluções e práticas de IA com outros tribunais, promovendo uma cultura de colaboração que pode acelerar a inovação e a adoção da IA em todo o sistema de controle externo.

A pesquisa de 2024 evidenciou um progresso significativo na aplicação da IA nos Tribunais de Contas, com áreas de controle externo e administrativas liderando a adoção. No entanto, os desafios relacionados à capacitação técnica, contratação de serviços e falta de estrutura organizacional específica ainda precisam ser superados. A implementação de ações futuras que abordem essas áreas será crucial para garantir que a IA seja utilizada de maneira eficaz e sustentável nos TCs. A continuidade na investigação e aplicação desses resultados será fundamental para assegurar que a IA seja utilizada de forma eficaz, responsável e ética, garantindo assim que os TCs continuem a evoluir e a tirar o máximo proveito dessa tecnologia emergente para auxiliar no cumprimento de sua valiosa missão constitucional.

*Fábio Correa Xavier é Diretor do Departamento de Tecnologia da Informação (DTI) do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo (TCESP)

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